quinta-feira, dezembro 27, 2012
quarta-feira, dezembro 19, 2012
terça-feira, dezembro 18, 2012
Determinado a dar aos filhos uma educação militarista, o pai do major, quando regressou da guerra, resolveu iniciar as crianças nos prazeres da caça que, como é certo e sabido, fortalece o carácter dos mais novos. Acima de tudo, era necessário enxertar valores no espírito dos rapazes e a caça impunha-se pelo seu furor, pela eterna luta pela sobrevivência que lima a intrepidez do homem. O jovem George achou-se cedo nos campos e nos prados, de caçadeira na mão, no meio de pesadas neblinas. Nas Midlands abundavam as mais diversas aves: pardais, faisões, pombos-bravos. perdizes, galinhas-parteiras, galos-lira. George achava as aves um pouco estúpidas e, por isso, gostava mais de caçar pequenos mamíferos. Para grande satisfação do pai, revelou ter aquilo que caçadores chamam - com muito pouca imaginação - de "instinto de caçador".
segunda-feira, dezembro 10, 2012
segunda-feira, dezembro 03, 2012
Orestes assustou-se com a aparição e não conseguiu deixar de corar perante o encanto vicioso da mulher. Já tinha saboreado a pele embriagante das mulheres, mas nunca tinha estado na presença de uma profissional do sexo. As sarças-ardentes da ilha natal durante o Verão eram um flagelo e não davam descanso aos rapazolas que tinham de fazer trinta por uma linha para compensar a lentidão dos mais velhos.
quarta-feira, novembro 28, 2012
terça-feira, novembro 20, 2012
A prisão de Nicolas Fouquet
- Diz-me fouquet, Fouquet! - pergunta o rei.
- Perdoai-me, sua Majestarde, mas nada direi! - replica Fouquet numa tabela de antologia.
- D'Artagnan, frendei este homem! - ordenha o rei.
D'Artagnan larga o jogo de canastra - ou será blackjack? - e imediatamente prende Fouquet.
- D'Armagnac: és um sabujo, larga-me - brada Fouquet.
- Calai-vos Fouquet, a vossa imfunidade jaz aqui! - alaúda o rei.
D'Artagnan tira uma máscara de ferro que tinha aconchegada no traseiro e coloca-a na cara de Fouquet.
- Serás comutado para Fignerol.- informa o Rei.
- Aramis, Marie, acudam-me! - suplica Fouquet.
Aramis e a marquesa* choram copiosamente e não podem valer a Fouquet. O sal das lágrimas de Aramis limpa o seu herpes labial.
- "Deus, decompus corpus nus em húmus, ó céus de Emaús, ó cangurus dos Pirinéus, predispus e pressupus maniqueus nos liceus, o ônus nos Museus dos Cajus, transpus tatus para urubus, supus réus plebeus, interpus chuchus em Manaus, repus perus por bacalhaus, impus cus europeus que fizeram jus, expus Jesus a judeus com paus." Retracta-te e salva-te, Fouquet!- vocifera o Rei.
- لله أكبر, sou inocente, meu rei - ajoelha-se Fouquet.
E assim é preso Nicolas Fouquet, o nobre que ousou ombrear no fausto com Luis XIV.
* Maria de Rabutin-Chantal, marquesa de Sévigné.
- Perdoai-me, sua Majestarde, mas nada direi! - replica Fouquet numa tabela de antologia.
- D'Artagnan, frendei este homem! - ordenha o rei.
D'Artagnan larga o jogo de canastra - ou será blackjack? - e imediatamente prende Fouquet.
- D'Armagnac: és um sabujo, larga-me - brada Fouquet.
- Calai-vos Fouquet, a vossa imfunidade jaz aqui! - alaúda o rei.
D'Artagnan tira uma máscara de ferro que tinha aconchegada no traseiro e coloca-a na cara de Fouquet.
- Serás comutado para Fignerol.- informa o Rei.
- Aramis, Marie, acudam-me! - suplica Fouquet.
Aramis e a marquesa* choram copiosamente e não podem valer a Fouquet. O sal das lágrimas de Aramis limpa o seu herpes labial.
- "Deus, decompus corpus nus em húmus, ó céus de Emaús, ó cangurus dos Pirinéus, predispus e pressupus maniqueus nos liceus, o ônus nos Museus dos Cajus, transpus tatus para urubus, supus réus plebeus, interpus chuchus em Manaus, repus perus por bacalhaus, impus cus europeus que fizeram jus, expus Jesus a judeus com paus." Retracta-te e salva-te, Fouquet!- vocifera o Rei.
- لله أكبر, sou inocente, meu rei - ajoelha-se Fouquet.
E assim é preso Nicolas Fouquet, o nobre que ousou ombrear no fausto com Luis XIV.
* Maria de Rabutin-Chantal, marquesa de Sévigné.
quarta-feira, novembro 07, 2012
terça-feira, outubro 30, 2012
sábado, outubro 20, 2012
Extrema-unção
Uma breve, amável mágoa à
flor dos olhos, um distante desapontamento,
morrias como se pedisses desculpa
por nos fazeres perder tempo.
Tinhas pressa mas não o mostravas,
receavas que não estivéssemos preparados,
e, suspenso sobre nós, esperavas
que disséssemos tudo, que fizéssemos o apropriado.
Morrer não é motivo de orgulho,
mas estavas cansado de mais para te justificares.
Ainda por cima no mês de Julho,
com as férias marcadas, ausentes os familiares.
Tínhamos levado as crianças de casa,
feito os telefonemas, escolhido os dizeres.
O quarto fora arrumado, a cama mudada
com roupa lavada. Só faltava morreres.
© 2001, Manuel António Pina
Atropelamento e fuga
Asa, Porto, 2001
flor dos olhos, um distante desapontamento,
morrias como se pedisses desculpa
por nos fazeres perder tempo.
Tinhas pressa mas não o mostravas,
receavas que não estivéssemos preparados,
e, suspenso sobre nós, esperavas
que disséssemos tudo, que fizéssemos o apropriado.
Morrer não é motivo de orgulho,
mas estavas cansado de mais para te justificares.
Ainda por cima no mês de Julho,
com as férias marcadas, ausentes os familiares.
Tínhamos levado as crianças de casa,
feito os telefonemas, escolhido os dizeres.
O quarto fora arrumado, a cama mudada
com roupa lavada. Só faltava morreres.
© 2001, Manuel António Pina
Atropelamento e fuga
Asa, Porto, 2001
sexta-feira, outubro 19, 2012
Novos Talentos FNAC Literatura 2012
O livro Novos Talentos FNAC Literatura 2012 que inclui o meu conto "Shoodíaco" já está disponível nos espaços FNAC.
Convido-vos a visitarem o seguinte link:
quinta-feira, outubro 18, 2012
Sem nunca olhar para trás, Orestes chegou a um rio que conseguiu atravessar a vau. Mais a menos a meio, viu um homem a cerca de vinte metros do lado da nascente que parecia estar trajado como os antigos hoplitas. Aproximou-se lentamente de Orestes pela margem e perguntou-lhe o que fazia ali.
- Pretendo ir para Abdera. Sou um homem de paz. Apenas quero arranjar trabalho.
O homem amenizou o ar ameaçador, embainhando a espada que era de pau. Tirou o elmo de latão cuja crista parecia ser de pêlo de texugo e baixou o escudo que exibia o desenho de um grande cacho de uvas.
- Sou o guardador deste rio e das vinhas que ali vês. O vinho é o ganha-pão do meu povo. Há muitos salteadores e vagabundos por estas bandas que nos roubam as uvas e nos dão cabo das videiras. Há dias apanhei um doido a violar uma cepa e a apalpar os cachos como se fossem os seios de uma mulher. O desgraçado era roncolho, mas cortei-lhe o único que ainda tinha e plantei-o. O resto serviu de comida aos peixes e é por isso é que eles têm saído gordos do anzol.
Orestes mostrou as mãos, provando assim que não tinha nada e seguiu caminho. Quando já estava longe dali, ouviu uma risada estranha que ecoou pelo vale e que só poderia ser do terrível hoplita das vinhas.
- Pretendo ir para Abdera. Sou um homem de paz. Apenas quero arranjar trabalho.
O homem amenizou o ar ameaçador, embainhando a espada que era de pau. Tirou o elmo de latão cuja crista parecia ser de pêlo de texugo e baixou o escudo que exibia o desenho de um grande cacho de uvas.
- Sou o guardador deste rio e das vinhas que ali vês. O vinho é o ganha-pão do meu povo. Há muitos salteadores e vagabundos por estas bandas que nos roubam as uvas e nos dão cabo das videiras. Há dias apanhei um doido a violar uma cepa e a apalpar os cachos como se fossem os seios de uma mulher. O desgraçado era roncolho, mas cortei-lhe o único que ainda tinha e plantei-o. O resto serviu de comida aos peixes e é por isso é que eles têm saído gordos do anzol.
Orestes mostrou as mãos, provando assim que não tinha nada e seguiu caminho. Quando já estava longe dali, ouviu uma risada estranha que ecoou pelo vale e que só poderia ser do terrível hoplita das vinhas.
quinta-feira, outubro 04, 2012
Beast of burden
Todos os portugueses deveriam cantar esta melodia em jeito de serenata ao P.M.. Sem agressões verbais, sem apupos. Ele ficaria certamente enternecido.
quarta-feira, setembro 26, 2012
quarta-feira, setembro 19, 2012
terça-feira, setembro 18, 2012
(...) Já em terra, decidiram tentar a sorte em Abdera. Ouviram em pequenos as histórias de Hércules que vencera o cruel rei Diomedes depois deste ter matado o seu eromenos. O corpo do rei fora devorado pelos seus quatro terríveis cavalos que comiam carne humana. Sentiam-se pois bastante encorajados. Pelo caminho, passaram por um velho sentado à sombra de uma casa que parecia ter sido esventrada por um incêndio. O homem estava a fumar narguilé. Estava tão absorto que nem sequer se deu conta da presença dos dois. Com um dos dedos mindinhos tirava cera dos ouvidos para depois atirá-la com bastante perícia para cima de uma pequena vela que brilhava com mais intensidade por alguns momentos. Thiseas interpretou aquilo como um bom augúrio e adiantou-se ao irmão dando largas passadas. Evangelius cuspiu para o lado e continuou a caminhar devagar.(...)
quinta-feira, agosto 30, 2012
sexta-feira, agosto 24, 2012
(...)
Certo é que quando finalmente se deitou não conseguiu pregar olho. Sentia o corpo comprimido pelo cansaço e a sua cabeça era um novelo de pensamentos, actos e omissões. Nas raras noites de insónia, Evangelius gostava de contemplar uma pedra de cor âmbar que guardava à noitinha debaixo do travesseiro amarelecido. A pequena gema foi um dos muitos frutos indesejados de um atroz cálculo renal que Evangelius sofreu quando começou a trabalhar nas minas. Apenas a sua mãe sabia da existência destas pedras. Nesses tempos, as pessoas de Tasos tinham os cotovelos secos como casca de carvalho e eram pobres. Bastava um dos vizinhos saber que o moço expelia pequenas gemas pelo seu filão para que a notícia se espalhasse até à outra ponta da ilha. No dia seguinte, arrancar-lhe-iam sem piedade os rins incrustados de pedras preciosas para mandarem construir castelos na areia. (...)
Certo é que quando finalmente se deitou não conseguiu pregar olho. Sentia o corpo comprimido pelo cansaço e a sua cabeça era um novelo de pensamentos, actos e omissões. Nas raras noites de insónia, Evangelius gostava de contemplar uma pedra de cor âmbar que guardava à noitinha debaixo do travesseiro amarelecido. A pequena gema foi um dos muitos frutos indesejados de um atroz cálculo renal que Evangelius sofreu quando começou a trabalhar nas minas. Apenas a sua mãe sabia da existência destas pedras. Nesses tempos, as pessoas de Tasos tinham os cotovelos secos como casca de carvalho e eram pobres. Bastava um dos vizinhos saber que o moço expelia pequenas gemas pelo seu filão para que a notícia se espalhasse até à outra ponta da ilha. No dia seguinte, arrancar-lhe-iam sem piedade os rins incrustados de pedras preciosas para mandarem construir castelos na areia. (...)
segunda-feira, agosto 20, 2012
sexta-feira, agosto 03, 2012
segunda-feira, julho 30, 2012
J.J. será alinguarada com alegria
Os altifalantes na rua cantam as proezas do Querido Líder. Faz hoje um mês que morreu e o coração de Song continua pesaroso. Não quer acreditar que o Querido Líder partiu deste mundo. Vai à casa de banho, passa a cara por água e olha-se ao espelho. J.J. espera e sofre com ele. No quarto ao lado, alguém liga o televisor e ouve-se gritos e choros. Um pássaro branco, maior que uma pomba, pousa no parapeito da janela. J.J. chama Song e aponta para o pássaro. Song cai de joelhos e os seus olhos ficam húmidos de emoção. Os dois sentem uma enorme alegria e abraçam-se. É o pássaro branco, maior que uma pomba, que limpara a neve dos ombros da estátua do líder e que agora desceu dos céus para abençoar o seu amor.
terça-feira, julho 24, 2012
Velho conhecido
Tinha acabado de chegar ao aeroporto de táxi. Iria gozar as minhas primeiras férias num resort "tudo incluído" e estava ansioso por chegar ao meu destino. Desejava sol e praias de águas verdes-azuladas cristalinas. Desejava ver corpos morenos ensopados com Piz-Buin®. Desejava ser o Gauguin da era smartphone. Assim que empurrei a porta rolante, um homem estava a tentar empurrar do outro lado do vidro separador para poder sair. A cara do homem pareceu-me familiar. Dirige-me para perto do quadro das Partidas. Ainda tinha duas horas e meia antes do voo. Peguei no trólei e fui sentar-me perto da porta rolante. Olhei através da vidraça. O tal homem estava na fila dos táxis. Sim, definitivamente já me cruzei com este homem, mas quando? E onde? Estávamos em pleno Agosto, mas ele segurava firmemente um guarda-chuva e vestia um sobretudo preto que lhe estava dois tamanhos acima. Parecia sondar as pessoas que o rodeavam. As pessoas sentiam-se algo incomodadas e desviavam o olhar, tentando ignorá-lo. De vez em quando, punha-se em bicos de pés para ver melhor o cocuruto dos homens que eram quase todos mais altos do que ele. Deveria estar perto dos cinquenta anos. Estaria à espera de alguém? Provavelmente esteve fora do país durante muito tempo e estava a tentar reconhecer algum familiar que o tinha vindo buscar.
Os meus pensamentos foram interrompidos por um estupendo grito que quase me ensurdeceu. A mãe de tal criatura - que tinha uma dicção que deveria ser estudada por linguistas - recusava dar ao miúdo um chocolate ou lá o que era da máquina de vending. Nova tentativa desesperada do infante. Desta vez eu estava preparado, mas o miúdo deveria ser um mutante, pois até o pessoal da torre de controlo deve ter ouvido o seu grito endemoninhado. Encolhi os ombros à mãe e fui lá para fora. Levei em cheio com uma bofetada de calor que parecia não querer dar tréguas. Olhei na direcção dos táxis. O homem já não estava na fila. Deve ter apanhado um táxi ou alguém veio finalmente buscá-lo. Senti um estranho desalento e levei a mão ao maço de tabaco que tinha no bolso de trás das calças. No momento em que me preparava para acender o cigarro, senti uma pancada na cabeça que me fez deixar cair o cigarro e o isqueiro. Virei-me imediatamente para trás. Era ele! Reconheci-o finalmente.
Os meus pensamentos foram interrompidos por um estupendo grito que quase me ensurdeceu. A mãe de tal criatura - que tinha uma dicção que deveria ser estudada por linguistas - recusava dar ao miúdo um chocolate ou lá o que era da máquina de vending. Nova tentativa desesperada do infante. Desta vez eu estava preparado, mas o miúdo deveria ser um mutante, pois até o pessoal da torre de controlo deve ter ouvido o seu grito endemoninhado. Encolhi os ombros à mãe e fui lá para fora. Levei em cheio com uma bofetada de calor que parecia não querer dar tréguas. Olhei na direcção dos táxis. O homem já não estava na fila. Deve ter apanhado um táxi ou alguém veio finalmente buscá-lo. Senti um estranho desalento e levei a mão ao maço de tabaco que tinha no bolso de trás das calças. No momento em que me preparava para acender o cigarro, senti uma pancada na cabeça que me fez deixar cair o cigarro e o isqueiro. Virei-me imediatamente para trás. Era ele! Reconheci-o finalmente.
O homem que tem o costume de dar com um guarda-chuva na cabeça. Atravessara o Atlântico e escolheu a minha cabeça. Que Deus me proteja e São Sorrentino me valha.
segunda-feira, julho 16, 2012
sexta-feira, julho 06, 2012
Shoodíaco
(...) A lua está cheia. Está de tal forma cheia que parece que vai parir pequenas luazinhas. A sua missão, caso a aceite, será a de elaborar sucintamente (não queremos verborreias técnicas) os signos de um novo Zodíaco (o actual é bastante falível) para serem lidos e apreciados na próxima reunião shandy que irá ocorrer amanhã à noite.
Esta carta não se irá autodestruir – p. f. tenha a bondade de a rasgar em pequenos quadrados de 2 mm² (envio em anexo uma amostra para sua referência).
Imprescritivelmente, D.
P.S.S.T.: Não se esqueça do seu odradek. (...)
"Shoodíaco" - já podem votar.
sexta-feira, junho 29, 2012
terça-feira, junho 19, 2012
Segundo parecer
Arregacei a manga da camisa e estendi o braço. O médico, porém, levou a câmpanula do estetoscópio à minha testa e disse-me para pensar fundo. Antes de entrar, tinha-me pedido para tirar os sapatos e as meias. O chão do consultório tinha pequenas brasas espalhadas no chão que tentei não pisar. Sempre que sentia um pensamento, o médico escrevinhava num pequeno bloco e tossia para o lado. Passou-me a receita sem nunca olhar para mim e meteu-a num envelope branco juntamente com um boletim, entregando-mo de seguida. Ajeitou os óculos e olhou para mim como que a perguntar-me porque é que ainda estava ali. Calcei-me, desci a escadaria branca para o segundo andar e esperei pela minha vez. Só havia uma mulher à minha frente que tinha sobre o colo um estore enrolado. Parecia estar a sorrir, mas também poderia ser um tique de expressão. A auxiliar chamou-a. Ela não se mexeu. A auxiliar então segredou-lhe algo ao ouvido e a mulher levantou-se e seguiu-a com o estore debaixo do braço. A sala de espera cheirava a éter e no meio do chão havia um ralo. Apesar do isolamento acústico das janelas, conseguia ouvir o ruído dos carros lá fora. Senti uma enorme vontade de ler o que o médico número um tinha escrito, mas lembrei-me de que não iria servir-me de muito.
quarta-feira, junho 13, 2012
terça-feira, junho 05, 2012
Secreções Anima e Animus
PROGRAMA DA EXPOSIÇÃO "SECREÇÕES ANIMA & ANIMUS"
01 Julho a 31 Agosto 2012
A exposição temporária "Secreções Anima & Animus" de Leon Closset estará patente no Museu de Serralves e irá reunir uma ampla selecção de trabalhos do premiado artista plástico (Antuérpia, 1965) acompanhada por quatro performances de Closset nas duas primeiras noites de lua cheia de cada mês (vide Calendário Lunar).
A exuberância cromática dos trabalhos é produto "directo" do seu enredo onírico. Ao longo dos anos, Closset adensou a sua obra, fruto de um rigoroso método de trabalho que tem vindo a aperfeiçoar na última década. Estas manifestações não só têm servido de inspiração para outros artistas visuais, como também constituem objecto de estudo para neurologistas, psicólogos e psiquiatras, dado o perfil extremamente invulgar (talvez único) da obra. Esta exposição é a primeira oportunidade para o público português se confrontar com algumas das criações produzidas pelo artista belga nos últimos anos.
As obras estarão compartimentadas em cubículos de acrílico de 3x2x2 m. Serão colocadas pequenas amostras à frente de cada cubículo que poderão ser experimentadas pelo público. Trata-se de secreções libertadas pelos canais auditivos do artista durante o sono, resultado "físico" do seu repositório de memórias e pulsões reprimidas, veiculadas em sonhos mais ou menos complexos que se materializam em secreções que estarão organizadas por cor, textura/viscosidade e quantidade. Segundo o próprio autor, uma suas das mais famosas secreções, "Maré Negra", foi produzida aquando do último derrame no Golfo em 2010. Closset ficou "extremamente abalado" pelas imagens do desastre ecológico que viu na televisão e acordou nos dias que se seguiram quase imerso numa massa pastosa negra semelhante a crude que quase lhe custou a vida.
É conhecido o seu método de privação de sono que provoca manifestações de cerúmen de um variado espectro cromático e de curiosas texturas. "Flamingo" é uma extraordinária série com alto índice de viscosidade e densidade, de cores intensas (vermelho, rosa) produzida durante o período em que Closset viveu em Paris.
01 Julho a 31 Agosto 2012
A exposição temporária "Secreções Anima & Animus" de Leon Closset estará patente no Museu de Serralves e irá reunir uma ampla selecção de trabalhos do premiado artista plástico (Antuérpia, 1965) acompanhada por quatro performances de Closset nas duas primeiras noites de lua cheia de cada mês (vide Calendário Lunar).
A exuberância cromática dos trabalhos é produto "directo" do seu enredo onírico. Ao longo dos anos, Closset adensou a sua obra, fruto de um rigoroso método de trabalho que tem vindo a aperfeiçoar na última década. Estas manifestações não só têm servido de inspiração para outros artistas visuais, como também constituem objecto de estudo para neurologistas, psicólogos e psiquiatras, dado o perfil extremamente invulgar (talvez único) da obra. Esta exposição é a primeira oportunidade para o público português se confrontar com algumas das criações produzidas pelo artista belga nos últimos anos.
As obras estarão compartimentadas em cubículos de acrílico de 3x2x2 m. Serão colocadas pequenas amostras à frente de cada cubículo que poderão ser experimentadas pelo público. Trata-se de secreções libertadas pelos canais auditivos do artista durante o sono, resultado "físico" do seu repositório de memórias e pulsões reprimidas, veiculadas em sonhos mais ou menos complexos que se materializam em secreções que estarão organizadas por cor, textura/viscosidade e quantidade. Segundo o próprio autor, uma suas das mais famosas secreções, "Maré Negra", foi produzida aquando do último derrame no Golfo em 2010. Closset ficou "extremamente abalado" pelas imagens do desastre ecológico que viu na televisão e acordou nos dias que se seguiram quase imerso numa massa pastosa negra semelhante a crude que quase lhe custou a vida.
É conhecido o seu método de privação de sono que provoca manifestações de cerúmen de um variado espectro cromático e de curiosas texturas. "Flamingo" é uma extraordinária série com alto índice de viscosidade e densidade, de cores intensas (vermelho, rosa) produzida durante o período em que Closset viveu em Paris.
segunda-feira, junho 04, 2012
A pedido da menina Cristas que mora em Lisboa e que gostaria de dedicar a Alguém muito especial.
Rain
Rain
terça-feira, maio 22, 2012
segunda-feira, maio 21, 2012
A Nova Crise do Açúcar
Para bom apreciador
meia colher basta.
A Nova Companhia Holandesa
das Índias Ocidentais,
num acto de luxúria
sem precedentes,
comprou toda
a produção mundial de açúcar
para vender aos construtores
do Delta da Zelândia.
Em vez de areia e terra
atafulharam terps e diques
com toneladas de açúcar refinado.
Os holandeses são o povo
mais perverso da Europa.
meia colher basta.
A Nova Companhia Holandesa
das Índias Ocidentais,
num acto de luxúria
sem precedentes,
comprou toda
a produção mundial de açúcar
para vender aos construtores
do Delta da Zelândia.
Em vez de areia e terra
atafulharam terps e diques
com toneladas de açúcar refinado.
Os holandeses são o povo
mais perverso da Europa.
sábado, maio 19, 2012
segunda-feira, maio 07, 2012
Fome
Uma das coisas boas sobre sentir ou "passar" fome é que - ao contrário de comer - podemos fazê-lo em qualquer lado. Não são necessários grandes meios para passar fome. Posso viver (por poucos dias, é certo), sem a mínima preparação, num sítio onde a fome reina. A fome une as pessoas num único desígnio. Filosofia, Amor, Fé, talvez até o sexo perdem força perante a Fome suprema. Escusado será dizer que sou inteiramente contra a criação dos chamados "lugares de fome" que possam vir a ser concebidos por este ou por qualquer outro Governo. A fome é um acto livre e inalienável de qualquer cidadão.
sexta-feira, maio 04, 2012
Debordo
Tenho um amigo psicogeógrafo que morava no centro da cidade. Costumava apregoar aos quatro ventos que nunca se tinha perdido nem mesmo quando foi numa viagem de estudo às ilhas Frígídas. Sentia repulsa por pessoas que usavam bússolas e ficava horrorizado quando via turistas de mapa aberto no meio da calçada. Quando alguém lhe pedia indicações, Debordo respirava fundo (não muito para não incomodar uma pleurite de estimação que tinha há algum tempo) e encaminhava o pobre coitado para os antípodas do local procurado.
Como era um tipo reservado, cansou-se de ser considerado "imperdível" e debandou para o Alentejo profundo. Foi dado como desaparecido há duas semanas e foi visto pela última vez por dois velhotes de Cuba aos quais pintara as unhas de vermelho para usar como referência. Debordo não rima com Alentejo.
Como era um tipo reservado, cansou-se de ser considerado "imperdível" e debandou para o Alentejo profundo. Foi dado como desaparecido há duas semanas e foi visto pela última vez por dois velhotes de Cuba aos quais pintara as unhas de vermelho para usar como referência. Debordo não rima com Alentejo.
quarta-feira, maio 02, 2012
Não resisti
Ontem fui ao Corte Inglês, porque o pata negra deles estava em promoção e as funcionárias são 50% mais jeitosas do que as do P.D..
terça-feira, abril 24, 2012
sexta-feira, abril 20, 2012
quinta-feira, abril 19, 2012
quarta-feira, abril 04, 2012
Harpa
O nome do seu irmão
era Jubal; este foi o pai de todos os que tocam harpa e flauta.
Génesis 4:21
Génesis 4:21
Jubal era descendente directo de Caim e tinha vergonha de o ser. Decidiu cantar aos sete ventos a sua desdita e, para tal, inventou um instrumento de corda que se assemelhava a um arco de caça. Jubal pensava que, deste modo, ludibriaria o seu pai, Lameque, caçador furtivo que não alinhava em cantorias. Um dia, porém, Lameque descobriu o filho a cantar o “Blues de Abel” no cimo de um monte e aprisionou-o na sua tenda até ao fim dos seus dias. A lenda diz que no local onde Jubal morreu nasceu a povoação de Şanlıurfa (Turquia) onde todos aqueles que nascem com cinco dedos em cada mão tocam çeng (tipo de harpa quadrada otomana) de forma magistral.
A constelação de Harpa pode ser vista na ilha de Tristão de Cunha, no Hemisfério Sul, e representa Jubal a dedilhar o delicado instrumento.
(...)
sexta-feira, março 23, 2012
segunda-feira, março 19, 2012
Os Primeiros Cem Números em Português Ordenados por Ordem Alfabética
Centésimo, décimo, décimo nono, décimo oitavo, décimo quarto, décimo quinto, décimo sétimo, décimo sexto, duodécimo, nonagésimo, nonagésimo nono, nonagésimo oitavo, nonagésimo primeiro, nonagésimo quarto, nonagésimo quinto, nonagésimo segundo, nonagésimo sétimo, nonagésimo sexto, nonagésimo terceiro, nono, octogésimo, octogésimo nono, octogésimo oitavo, octogésimo primeiro, octogésimo quarto, octogésimo quinto, octogésimo segundo, octogésimo sétimo, octogésimo sexto, octogésimo terceiro, oitavo, primeiro, quadragésimo, quadragésimo nono, quadragésimo oitavo, quadragésimo primeiro, quadragésimo quarto, quadragésimo quinto, quadragésimo segundo, quadragésimo sétimo, quadragésimo sexto, quadragésimo terceiro, quarto, quinquagésimo, quinquagésimo nono, quinquagésimo oitavo, quinquagésimo primeiro, quinquagésimo quarto, quinquagésimo quinto, quinquagésimo segundo, quinquagésimo sétimo, quinquagésimo sexto, quinquagésimo terceiro, quinto, segundo, septuagésimo, septuagésimo nono, septuagésimo oitavo, septuagésimo primeiro, septuagésimo quarto, septuagésimo quinto, septuagésimo segundo, septuagésimo sétimo, septuagésimo sexto, septuagésimo terceiro, sétimo, sexagésimo, sexagésimo nono, sexagésimo oitavo, sexagésimo primeiro, sexagésimo quarto, sexagésimo quinto, sexagésimo segundo, sexagésimo sétimo, sexagésimo sexto, sexagésimo terceiro, sexto, terceiro, tredécimo, trigésimo, trigésimo nono, trigésimo oitavo, trigésimo primeiro, trigésimo quarto, trigésimo quinto, trigésimo segundo, trigésimo sétimo, trigésimo sexto, trigésimo terceiro, undécimo, vigésimo, vigésimo nono, vigésimo oitavo, vigésimo primeiro, vigésimo quarto, vigésimo quinto, vigésimo segundo, vigésimo sétimo, vigésimo sexto, vigésimo terceiro.
segunda-feira, março 05, 2012
sexta-feira, março 02, 2012
Lázaro Fitzgeraldo
Lázaro Fitzgeraldo nasceu da narina direita da sua mãe e sempre que podia ia brincar para a passagem de nível que ficava perto de sua casa. Os pais raramente estavam em casa, gostavam de se instalar na sua casa da cidade para gastar dinheiro velho em festas. A mansão tinha muita criadagem que fazia quase todas as vontades ao rapazote. Certa vez, quis provar carne de pégaso e o mordomo lá teve de falar com o couteiro para ver se caçava um naquela altura do ano. O couteiro chegou de mãos a abanar (tinha lavado as mãos no tanque), e o mordomo teve de dizer ao cozinheiro para preparar um guisado de carne de cavalo e de galinha. Lázaro provou mas amuou, porque sempre achou que a carne de pégaso seria mais saborosa. Há bem pouco tempo, queria que todas as criadas levantassem as saias quando passassem por ele para lhes ver as partes íntimas. A governanta, bem mais velha, passou um valente raspanete a Lázaro por ter dado tal ordem. No fundo, a velha senhora tinha ficado aborrecida por Lázaro não lhe ter feito o pedido a ela também. Enfim, Lázaro estava a crescer. Quando não estava em casa ou na escola para crianças-parasitas, gostava de ir brincar na passagem de nível, porque crescia sempre mais um bocado quando as furiosas locomotivas e as pesadas carruagens passavam por ele, fazendo tremer o chão. Certo dia, porém, quando regressava a casa, Lázaro reparou que o seu pé esquerdo era muito pequeno, quase do tamanho de um pêssego. Lázaro ficou muito infeliz e quis ver-se livre desse pé. Voltou para trás e pôs o pé em cima da linha do comboio. Lázaro esperou, esperou, mas não havia maneira da locomotiva aparecer. O rapaz estava quase a desistir e a ir-se embora, quando reparou ao longe numa rapariga vestida de branco que vinha a saltitar de tábua em tábua no meio da linha.
- Que estás a fazer? - perguntou a rapariga.
- Quero cortar o meu pé esquerdo, é feio e pequeno como um pêssego! - respondeu Lázaro.
- Tens um pé mais pequeno do que outro, o que é que isso importa? Vê os dedos das minhas mãos, não são todos do mesmo tamanho. Já tu tens os dedos todos iguais!
- Sim, tens razão.
Subiram os dois para cima da cancela e não demorou muito até ouvirem o troar de uma locomotiva ao longe.
- Que estás a fazer? - perguntou a rapariga.
- Quero cortar o meu pé esquerdo, é feio e pequeno como um pêssego! - respondeu Lázaro.
- Tens um pé mais pequeno do que outro, o que é que isso importa? Vê os dedos das minhas mãos, não são todos do mesmo tamanho. Já tu tens os dedos todos iguais!
- Sim, tens razão.
Subiram os dois para cima da cancela e não demorou muito até ouvirem o troar de uma locomotiva ao longe.
segunda-feira, fevereiro 20, 2012
sexta-feira, fevereiro 17, 2012
Os bailarinos da dança da pança
Se os indicadores encaixassem perfeitamente nas covinhas das costas da filha mais velha do xeique, o viajante seria bem-vindo na tenda do meio que mais parecia um enorme pássaro branco. Era a única mulher autorizada a entrar naquela tenda. O viajante teria de lhe entregar um alforge com leite de cabra como forma de agradecimento e de reconhecimento. Acomodava-se à sua vontade e era-lhe servido chá, pão com tâmaras e depois vinho em abundância. Homens de tribos rivais, de diversas etnias, oriundos dos sítios mais remotos do grande deserto, comungavam ali uma paz temporária. O anfitrião levantava-se e batia palmas para iniciar o tão aguardado espetáculo. Os músicos começavam a bater furiosamente nos derbakes e os bailarinos entravam em cena. Não deveriam ter menos de quarenta anos. Estes homens de barba rija faziam dançar admiravelmente o seu ventre generoso para enorme júbilo dos presentes. As reverências e os velhos rancores seriam esquecidos nessa noite.
quinta-feira, fevereiro 09, 2012
sexta-feira, janeiro 27, 2012
quinta-feira, janeiro 26, 2012
Ghost writer
Se me convidassem, teria todo o prazer em ser o ghost-writer das memórias do nosso Presidente de República. E não me importava de ser a última opção da editora, caso outros recusassem a proposta. Gosto muito de biografias e de fábulas.
terça-feira, janeiro 24, 2012
Braille e os novelos de lã
Braille, nessa altura, dedicava-se a fazer novelos de lã para fora e era realmente bom nesse ofício. Tinha uma longa fila de clientes à porta logo de manhã, e alguns vinham de muito longe. Sempre fora muito metódico e gostava de dar um toque dramático a tudo aquilo que fazia. Antes de começar a enrolar, punha bastante pó-de-arroz na cara e pintava-se ao jeito dos oonagata, os actores de kabuki. Dizia-se que a cabeleira postiça que usava tinha sido feita com cabelos de Napoleão. De Napoleão! Quem podia confirmar se isto era verdade ou não?
Ao longo da "novelada" que se desenrolava na sua sala de visitas, Braille fazia movimentos que intercalavam entre o abrupto e o gracioso para grande rejubilo do cliente e de Sklerós, seu assistente. Os clientes saiam quase sempre muito satisfeitos. Quando não gostava de determinado cliente, não o recusava: entrava em cena normalmente, mas depois permanecia imóvel durante longos minutos com uma expressão inusitada e com meio novelo na mão. O cliente mais cedo ou mais tarde acabaria por ceder. Sklerós pousava então a malha por enrolar e indicava gentilmente a saída ao infeliz.
quinta-feira, janeiro 19, 2012
Padres de choque
Os padres de choque tiveram origem na região da Apulia (Itália) nos anos 50 e foram os predecessores dos famosos carrinhos de choque que todos nós tão bem conhecemos. É apresentada em seguida uma tradução das "domande frequenti"/FAQs extraídas de um Manual do Utilizador Fiel encontrado recentemente na biblioteca de Santa Croce, em Lecce:
- Quem pode usufruir dos padres de choque?
- Toda a gente que tenha sido crismada, excepto rabinos e albaneses.
- Como é que funciona?
- A pessoa deve dirigir-se à sacristia, pedir uma hóstia, escolher o padre da sua preferência e colocar a hóstia na boca do padre. Depois basta subir às suas cavalitas. Existem padres de várias cores e de diferentes batinas.
- Os padres são seguros?
- Estes são.
- Quanto tempo posso andar nas cavalitas do padre?
- Cada hóstia dá direito a um tempo de viagem correspondente a mais ou menos três padres-nossos.
- Podemos orar em silêncio quando estamos às cavalitas dos padres de choque?
- Sim.
- Podemos cantar ao Senhor quando estamos às cavalitas dos padres de choque?
- Sim.
A falta de vocação e a escassez de leigos especializados na manutenção fizeram com que os padres de choque fossem substituídos por máquinas na década seguinte.
- Quem pode usufruir dos padres de choque?
- Toda a gente que tenha sido crismada, excepto rabinos e albaneses.
- Como é que funciona?
- A pessoa deve dirigir-se à sacristia, pedir uma hóstia, escolher o padre da sua preferência e colocar a hóstia na boca do padre. Depois basta subir às suas cavalitas. Existem padres de várias cores e de diferentes batinas.
- Os padres são seguros?
- Estes são.
- Quanto tempo posso andar nas cavalitas do padre?
- Cada hóstia dá direito a um tempo de viagem correspondente a mais ou menos três padres-nossos.
- Podemos orar em silêncio quando estamos às cavalitas dos padres de choque?
- Sim.
- Podemos cantar ao Senhor quando estamos às cavalitas dos padres de choque?
- Sim.
A falta de vocação e a escassez de leigos especializados na manutenção fizeram com que os padres de choque fossem substituídos por máquinas na década seguinte.
sexta-feira, janeiro 13, 2012
quarta-feira, janeiro 04, 2012
A maleta
Quando um homem de capachinho sai de um banco com uma maleta encostada ao peito é mau sinal. Os juros foram castigados, mas ele não quer saber. O senhor do banco sofre e ninguém nota, nem mesmo os colegas. Sofre em silêncio enquanto olha para o contador automático. O frufru das notas secam-lhe as lágrimas e ele lá se recompõe por fim.
O homem de capachinho pousa a mala no meio da praceta e senta-se no banco de jardim. Os transeuntes certificados olham para a maleta, mas ninguém pega nela. Passa a manhã. Passa a tarde. O homem de capachinho repara que o carvalho à sua frente está pintado de vermelho da cintura para baixo. Ainda assim, não sente qualquer intimidade com o carvalho. Alivia-se. Um grupo de mulheres aproxima-se e forma um círculo em torno da mala. As mulheres gesticulam e riem, e depois partem. Um miúdo omnipotente em cima de um skate pára ao pé da maleta. Tenta pegar na maleta, mas não consegue. Atira-a para os arbustos e parte para enfrentar o seu destino. O homem de capachinho levanta-se e volta a pousar a maleta no meio da praceta. Não há crepúsculo, o céu fica estrelado como uma tela de fundo que cai sobre um palco. É tempo de regressar a casa.
No dia seguinte, o homem de capachinho vai ao banco para voltar a depositar o dinheiro que tinha na maleta. O senhor do banco começa a chorar de felicidade e sente algo parecido com amor conjugal pelo homem de capachinho.
"Cada início é só continuação, e o livro das ocorrências está sempre aberto ao meio", pensa o homem de capachinho.
segunda-feira, janeiro 02, 2012
Seres Imaginários e Mitológicos da Lapónia - III parte
O ándagassii haŋŋá é um pato de rabo comprido cuja dieta alimentar inclui lentilhas e juncos, tendo por hábito evacuar flatos intestinais durante longos períodos de tempo, descrevendo grandes círculos na água. Quando termina, o pato vem a terra e abana com a cabeça como que a lamentar-se pelo seu comportamento (ándagassii: lamentar-se; pedir desculpa). Os lapões acreditam que se usarem uma pena deste pato sob a orelha ficam curados da prisão de ventre.
O biebmobárdni beskkoš é um andorilhão que vive nos beirais dos telhados. A ave gosta de pousar no ombro de crianças órfãs e de lhes limpar o cerume dos ouvidos.
O cealkit dearvvuođaid cizášfálli era utilizado antigamente para enviar agradecimentos e cumprimentos a familiares e amigos que viviam a grandes distâncias. Na maior parte das vezes, o pequeno falcão enganava-se no destinatário ou simplesmente desaparecia, e a ave deixou de ser usada na troca de mensagens. Curiosamente, é o símbolo dos correios na Lapónia.
A jos skuolfi (coruja-da-neve lacónica) emite um som parecido com "jos" ("se..." em português) quando se sente ameaçada. A ave permanece imóvel e parece mostrar uma atitude de desafio quando é avistada por caçadores, cantando sem parar "jos jos jos". A ave parece confiar absolutamente na sua penugem branca e na reputada falta de pontaria dos caçadores lapões.
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