terça-feira, junho 27, 2006

Um ano de vida


Parabéns!
A todos os transeuntes perdidos e aficionados anónimos que vieram ter por acaso a esta toca.

Parabéns a vocês!

De poesia - mas o que é a poesia?


Alguns - quer dizer nem todos. Nem a maioria de todos, mas a minoria. Excluindo escolas, onde se deve os próprios poetas, serão talvez dois em mil.
Gostam -mas também se gosta de canja de massa, gosta-se da lisonja e da cor azul, gosta-se de um velho cachecol, gosta-se de levar a sua avante, gosta-se de fazer festas a um cão.
De poesia - mas o que é a poesia? Algumas respostas vagas já foram dadas, mas eu não sei e não sei, e a isto me agarro como a um corrimão providencial.

Wislawa Szymborska

terça-feira, junho 20, 2006

quarta-feira, junho 14, 2006

Confessionário

"Nobody's loves me but my mother
and sometimes I think
she could be jiving too"
B.B. King

Depois de um destes dias de trabalho perfeitamente áridos e inconsequentes, senti que estava em falta para comigo mesmo e achei que deveria cumprir um dos sagrados sacramentos de deus: a Penitência ou Confissão. Há já algum tempo que não me penitenciava, era chegada a hora.

Além de ser muito mais barato de que ir a um psi, o sigilo sacramental não permite ao pastor divulgar os nossos pecados ao resto da comunidade, o que já não acontece com os psi's que devem gozar à brava quando resolvem descomprimir e trocar entre si as historietas dos seus clientes.

Depois de relatar os meus pecados por ordem de gravidade durante seis, sete minutos, houve um momento de silêncio por parte do meu confessor que me pareceu propositado. De repente, suspira e exclama solenemente:
- Eu amo-te, meu filho.
Mandou-me rezar 30 padres e 50 avés durante 5 dias para que deixasse de pensar em coisas absurdas e desnecessárias.
- Deves ir ao Seu encontro, não deves esperá-Lo.
Deu-me no fim um papel com uma morada em que dizia "LBV - aceitam-se voluntários". Abençoou-me, pigarreou e mandou-me embora. Antes de sair da Igreja, parei no altar de Sta. Teresinha, fascina-me a sua beleza púdica, o seu olhar inocente. Deposito sempre uma nota de dez euros na respectiva caixa de esmolas. Os querubins a seu lado piscaram-me logo o olho e sorriram como os miúdos que pedem em nome do Sto. António.

Bem, eu já tenho um LBV (Late Bottled Vintage) da Dow's de 1999, um bom ano. Acho que vou "passar" a última sugestão do seu padre e observar apenas a primeira, orar como um perdido nestas noites de insónia para depois sonhar com a minha Sta. Teresinha.

segunda-feira, junho 12, 2006

Gostos e Desgostos











Os gostos e os desgostos
levam ao poema
como podem levar
ao precipício
o poema fala do precipício
lá haverá choro
e ranger de dentes
e não haverá Kleenex
nem o Dr. Abílio Loffo
meu querido dentista
o poema fala do precipício
evitado a tempo
o mau poema não mata
(mais vale burro vivo
que sábio morto)

Adília Lopes

sexta-feira, junho 09, 2006

Um dia

Acordo. Adormeço, acordo outra vez. Salto da cama como um boneco de mola. Dou à corda antes de sair. Jogo à macaca no pátio da firma. Os meus colegas batem-me palminhas. Regresso a casa e corro. Tento ser mais rápido do que os meninos do remo que vogam no meio do douro.
A lua é cheia, mas a noite é vazia. Ouço homens do lixo e cães vadios a ladrarem. Jogo sozinho às escondidas na minha toca. Canso-me. Tenho um cubo mágico no lugar do coração que não pára de rodar. O lobo conta 96 carneiros e adormece por fim.

quarta-feira, junho 07, 2006

Fraco mas forte















Antônio Hélio Cabral


Fraco mas forte
Nada na mão
algo na v'rilha
remancho as noites
e troto os dias
entre tabaco
viris bebidas
fraco mas forte
de muitas vidas
(que eu já dormi
co'as duas mães
e as duas filhas
que vão à missa
com três mantilhas)

Nada na mão
algo na v'rilha
sofro comigo
luta intestina
(ao bem ao mal
a mesma alpista)
bebo contigo
cerveja uísqui
p'ra que se veja
mais rubra a crista

Nada na mão
algo na v'rilha
encontro a morte
no meio da vida
morte bonita
nada aflita
(ou é da minha
tão fraca vista?)
e tenho sorte

Nada na mão
algo na v'rilha
invisto contra
o zero puro
da minha vida

e duro, duro!

Alexandre O´Neill, in Poesias Completas