No início desta "coisa" que estamos a viver, associava a pandemia a obras distópicas ou pós-apocalipse. Era muito fácil. Estou a lembrar-me, assim de repente, de autores como Ballard ("High-Rise" salta logo à vista), Philip K. Dick, Bradbury, a própria Margaret Atwood, etc.
De repente, a realidade alternativa cai-nos em cheio no regaço e não sabemos bem o que fazer com ela. O problema deixa de ser exclusivamente chinês. Fala-se em inimigo invisível, prateleiras de papel higiénico esfumam-se, o pânico instala-se.
Entretanto, os dias em semi-reclusão monástica ou em estado de "ermita digital" desenrolam-se - muito lentamente - e vive-se, de uma forma ou de outra. A luz ao fundo do túnel varia em função do pessimismo de cada um (e do news feed) e dou por mim a pensar cada vez mais naquela obra que marcou o início da chamada idade adulta: "O Conde de Monte Cristo".
Edmund Dantés, o protagonista, passa treze anos na prisão do Castelo d'If, sendo punido injustamente por um crime que não cometeu. A liberdade é-lhe retirada.
Bem sei que a nossa liberdade não nos foi retirada, embora estejamos praticamente confinados à nossa casa, ao nosso Castelo d'If privado. Estamos condicionados pelo Estado de Emergência declarado.
Mas o que me faz pensar na obra de Dumas, não é tanto o tópico da liberdade. É um outro personagem da obra e aquilo que ele representa para mim, neste momento: o Abade Faria, o companheiro de cela de Dantés que será o seu mestre para várias artes e ofícios, a sua bolha de oxigénio, a esperança em tempo de reclusão.
No meu caso e, neste momento, o Abade Faria consegue simbolizar muita coisa: a minha família mais próxima, as pessoas que olham para mim na rua (tentando escrutinar se tenho ou não o vírus, uma espécie de paranóia colectiva ainda inofensiva). Também consegue abarcar o meu Consciente e o meu Inconsciente. A reclusão por tempo indeterminado lança esta força incrível que não podemos deixar de confrontar: a nossa mente.
É uma excelente oportunidade para limpar a cave e o sotão mentais. Não é fácil, mas algum dia teria de ser feito. É um botão "Reset" que nos é fornecido por um vírus que ainda tem "coroa", mas que - tenho quase a certeza - vai ser derrotado. Infelizmente, a vitória terá um preço bastante elevado, de milhares de vidas.
Não vou terminar com a frase prevísivel e estereotipada "seria bom se aprendêssemos a lição que este vírus nos está a dar, com esta situação limite que estamos a viver, etc., etc." porque seria de muito mau gosto. Todos sabemos que as coisas não são assim tão simples. Aprender demora tempo, às vezes várias gerações. Somos bem mais complicados do que os vírus.
De repente, a realidade alternativa cai-nos em cheio no regaço e não sabemos bem o que fazer com ela. O problema deixa de ser exclusivamente chinês. Fala-se em inimigo invisível, prateleiras de papel higiénico esfumam-se, o pânico instala-se.
Entretanto, os dias em semi-reclusão monástica ou em estado de "ermita digital" desenrolam-se - muito lentamente - e vive-se, de uma forma ou de outra. A luz ao fundo do túnel varia em função do pessimismo de cada um (e do news feed) e dou por mim a pensar cada vez mais naquela obra que marcou o início da chamada idade adulta: "O Conde de Monte Cristo".
Edmund Dantés, o protagonista, passa treze anos na prisão do Castelo d'If, sendo punido injustamente por um crime que não cometeu. A liberdade é-lhe retirada.
Bem sei que a nossa liberdade não nos foi retirada, embora estejamos praticamente confinados à nossa casa, ao nosso Castelo d'If privado. Estamos condicionados pelo Estado de Emergência declarado.
Mas o que me faz pensar na obra de Dumas, não é tanto o tópico da liberdade. É um outro personagem da obra e aquilo que ele representa para mim, neste momento: o Abade Faria, o companheiro de cela de Dantés que será o seu mestre para várias artes e ofícios, a sua bolha de oxigénio, a esperança em tempo de reclusão.
No meu caso e, neste momento, o Abade Faria consegue simbolizar muita coisa: a minha família mais próxima, as pessoas que olham para mim na rua (tentando escrutinar se tenho ou não o vírus, uma espécie de paranóia colectiva ainda inofensiva). Também consegue abarcar o meu Consciente e o meu Inconsciente. A reclusão por tempo indeterminado lança esta força incrível que não podemos deixar de confrontar: a nossa mente.
É uma excelente oportunidade para limpar a cave e o sotão mentais. Não é fácil, mas algum dia teria de ser feito. É um botão "Reset" que nos é fornecido por um vírus que ainda tem "coroa", mas que - tenho quase a certeza - vai ser derrotado. Infelizmente, a vitória terá um preço bastante elevado, de milhares de vidas.
Não vou terminar com a frase prevísivel e estereotipada "seria bom se aprendêssemos a lição que este vírus nos está a dar, com esta situação limite que estamos a viver, etc., etc." porque seria de muito mau gosto. Todos sabemos que as coisas não são assim tão simples. Aprender demora tempo, às vezes várias gerações. Somos bem mais complicados do que os vírus.