domingo, julho 04, 2010

O meu país

Sou emigrante e estou casado com o meu trabalho há já alguns anos. Foi uma boda muito bonita e alegre, todos os meus amigos e família me deram apoio e desejaram-me boa sorte. O meu pai deu-me uma picareta que, por sua vez, foi-lhe oferecida pelo seu pai. A minha lua de mel foi na China, numa gigantesca fábrica de componentes eléctricos. Ah, os chineses amam verdadeiramente o seu trabalho.
Para poder casar com o meu trabalho, o amor da minha vida, tive de abandonar o meu país. De onde eu venho, apenas os mais velhos têm autorização para poder casar com o seu trabalho. Mas a maioria não cumpre os seus votos matrimoniais, e alguns até
fazem o trabalho dos outros.
Antes de chegarem a velhos, todos os adultos celibatários dedicam-se à representação. O meu país é o maior exportador de actores e cabotinos do mundo. Por outro lado, importamos um grande volume de marionetas e fantoches por ano. São muito apreciados no meu país.
Todas as crianças do meu país são deficientes mentais até aos dez anos. Servem apenas para barrar o pão com manteiga dos adultos. Algumas berram e outras querem ser engolidoras de fogo ou cavaleiros, mas ninguém lhes dá importância. Depois dessa idade, são iniciados nas artes cénicas e os melhores dos melhores podem chegar ao governo.
Deixem-me falar das casas do meu país. As casas são térreas e têm um pequeno jardim. Não temos o costume desagradável de ficar à janela e ver quem passa. Os transeuntes são cativados pelas janelas mais bonitas e olham para dentro das casas.
Um dia hei-de regressar ao meu país na minha ambulância de luxo e construir uma casa tão grande em que todos vão querer olhar para dentro dela.