sábado, julho 24, 2010

quinta-feira, julho 22, 2010

Se, se...

- Se D. Dafoe vivesse nos dias de hoje, seria argumentista da série "Lost".
- Se Baudelaire vivesse nos dias de hoje, dedicaria as Flores do Mal aos "Bleus" e escreveria o Smog de Paris.
- Se Poe vivesse nos dias de hoje, seria argumentista de "True Blood".
- Se Proust vivesse nos dias de hoje, mandaria isolar o seu quarto em lã de rocha (e não em cortiça).
- Se Kafka vivesse nos dias de hoje, trabalharia numa seguradora na mesma, mas ganharia mais e mandaria o Max Brod dar uma curva.
- Se Louÿs vivesse nos dias de hoje, passaria o dia a descarregar filmes românticos da Internet.
- Se Pessoa vivesse nos dias de hoje, teria um heterónimo hip hop: MC PES. É provável que regressasse à África do Sul.
- Se Breton vivesse nos dias de hoje, dedicaria o "O Amor Louco" à Margarida Rebelo Pinto, musa e principal impulsionadora do Neo-Surrealismo em Portugal.
- Se todos estes escritores vivessem nos dias de hoje, teriam todos um IPod ou uma Wii.

terça-feira, julho 20, 2010


Fallen Bierstadt, Valerie Hegarty, 2007

O violador de poetas menores

Um título como este pode ser tremendamente auspicioso e despertar a curiosidade de alguns que querem cair no engodo de uma boa história. Por outro lado, também pode defraudar as expectativas desses corajosos à medida que vão progredindo (ou recuando, se a história valer realmente a pena) na sua leitura. O tombo para o autor será então maior. Declino já essa responsabilidade e desengano o leitor nesta rampa de lançamento onde quase tudo se decide. Não estou à altura (ou profundidade) de um título tão promissor. O público dispersa-se agora, restando apenas alguns resistentes conhecidos que cruzam os braços e que, à falta de melhor, resolvem ficar. Mas as coisas são como são e, como de outro modo não podem ser, devemos apreciá-las tal como nos são oferecidas:

o realizador Guido Anselmi acreditava que, após a sua morte, iria encarnar numa mulher de barriga de aluguer. Resolveu aprender tudo o que havia para aprender sobre mulheres e maternidade, e abandonou temporariamente os filmes. Apercebeu-se depois que estava enganado e que o seu inconsciente estava a dizer-lhe que deveria deixar italianíssimos descendentes neste mundo. Deixou de vez a sétima arte e, ao som de Verdi, fez furiosamente filhos até morrer, e agora toda a Itália está-lhe grata por isso. Vamos todos acreditar que foi exactamente isso o que aconteceu e afastar a ideia repleta de fel de que a musa apresentara a carta de demissão e que Guido já não poderia mais encenar paraísos e infernos como Dante(s).

domingo, julho 18, 2010


terça-feira, julho 13, 2010

Å



Vivo em Å há duas semanas. Ainda não apanhei um dia de sol desde que cheguei, tem trovejado todas as noites e adormeço quase sempre ao som do múrmurio da chuva. Durante o dia, o ar está sempre coberto por uma névoa espessa que contrasta com as casas vermelhas sobre estacas que se estendem ao longo da costa.
Vim para aqui porque conheci uma mulher pela internet. A nossa relação virtual evoluiu ao ponto de ela confessar que gostava de ser açoitada. Creio ter-lhe dito que dar-lhe-ia açoites de bom grado se isso lhe dava prazer. Como é normal neste tipo de relações, não medi as palavras. Disse-lhe ainda que estava desempregado. Nessa mesma noite, convidou-me para ir viver com ela. Não hesitei. A minha mãe deu-me a sua bênção com a lágrima da praxe, e apanhei o primeiro avião para Oslo dois dias depois.
Ela era inevitavelmente loura e possuía um olhar meigo, sereno. Quando começámos a falar através do "chat", disse-me que tinha ficado viúva há um ano e que o marido tinha trabalhado numa plataforma do Mar do Norte. Quando cheguei, lembro-me de lhe ter perguntado a causa de morte do marido. Ela esquivou-se e levou-me para o quarto. Na nossa primeira noite, pediu-me constantemente para ser insultada sempre que lhe batia com o cinto de pele de baleia. O meu léxico norueguês era muito limitado e então ofendia-a na minha língua. O efeito foi ainda melhor do que o desejado. As suas nádegas brancas ficaram zebradas de vermelho, ela dava o corpo ao manifesto.
A minha companheira trabalha num mercado local. Passei os primeiros dias a deambular pela pequena vila. Os locais não me cumprimentam. Achei que talvez fosse a minha má pronúncia ou uma questão de temperamento, ou talvez até uma demonstração contida de xenofobia paroquial. Bom, os grunhidos nocturnos da minha companheira devem chegar à Irlanda, pode ser isso também. No entanto, senti pouco depois que era "outra coisa". O olhar deles dizia-me algo diferente.

Ontem à noite, enquanto punha a mesa, ela pediu-me para pôr mais um prato.
- Convidaste alguém para jantar? - perguntei.
Não respondeu. Levou a colher de pau à minha boca e perguntou-me a sorrir se o ensopado de peixe estava a meu gosto.
Sentei-me e, enquanto abria uma garrafa de vinho tinto do Chile, a campaínha tocou.
Tirou o avental, pousou a mão em cima do meu ombro e voltou a sorrir. Apalpou o penteado e lá foi abrir a porta. Uma voz masculina. Pareceu-me ouvir a troca de um beijo, seguido de um pequeno grito. Quando me virei, a minha "mulher" estava de braço dado com um homem alto e magro, com um sorriso idiota estampado na cara vermelha.
- Ålberto, apresento-te Knut, o meu marido. Knut, este é o nosso Ålberto.

segunda-feira, julho 12, 2010

Começa-me ou eu nunca mais começo.

Após um cataclismo nuclear, apenas irão sobreviver duas coisas:
baratas e o Keith Richards

sexta-feira, julho 09, 2010

POR FAVOR TENTA NÃO FAZER FIGURA DE URSO

Na noite de 6 de Julho de 1984, The Jacksons reuniram-se e deram início a uma digressão de 55 datas pelos EUA e Canadá. Antes do primeiro espectáculo da "Victory Tour", o seguinte telegrama de "Boa Sorte" foi enviado a Michael Jackson pelo seu amigo, Marlon Brando.



Transcrição

CARO MICHAEL

PENSEI EM TI ESTA NOITE POR FAVOR TENTA NÃO FAZER FIGURA DE URSO E PELO AMOR DE DEUS NÃO CAIAS NO FOSSO DA ORQUESTRA.

MARLON

terça-feira, julho 06, 2010


domingo, julho 04, 2010

O meu país

Sou emigrante e estou casado com o meu trabalho há já alguns anos. Foi uma boda muito bonita e alegre, todos os meus amigos e família me deram apoio e desejaram-me boa sorte. O meu pai deu-me uma picareta que, por sua vez, foi-lhe oferecida pelo seu pai. A minha lua de mel foi na China, numa gigantesca fábrica de componentes eléctricos. Ah, os chineses amam verdadeiramente o seu trabalho.
Para poder casar com o meu trabalho, o amor da minha vida, tive de abandonar o meu país. De onde eu venho, apenas os mais velhos têm autorização para poder casar com o seu trabalho. Mas a maioria não cumpre os seus votos matrimoniais, e alguns até
fazem o trabalho dos outros.
Antes de chegarem a velhos, todos os adultos celibatários dedicam-se à representação. O meu país é o maior exportador de actores e cabotinos do mundo. Por outro lado, importamos um grande volume de marionetas e fantoches por ano. São muito apreciados no meu país.
Todas as crianças do meu país são deficientes mentais até aos dez anos. Servem apenas para barrar o pão com manteiga dos adultos. Algumas berram e outras querem ser engolidoras de fogo ou cavaleiros, mas ninguém lhes dá importância. Depois dessa idade, são iniciados nas artes cénicas e os melhores dos melhores podem chegar ao governo.
Deixem-me falar das casas do meu país. As casas são térreas e têm um pequeno jardim. Não temos o costume desagradável de ficar à janela e ver quem passa. Os transeuntes são cativados pelas janelas mais bonitas e olham para dentro das casas.
Um dia hei-de regressar ao meu país na minha ambulância de luxo e construir uma casa tão grande em que todos vão querer olhar para dentro dela.