quinta-feira, outubro 16, 2025

Um mestre sabe render-se por breves instantes

Tenho sempre dificuldades em enganar os meus pensamentos, porque eles são demasiado rápidos para mim. Quando estou mais cansado ou mais vulnerável como hoje, eles "apanham-me na curva" como se costuma dizer.  
Mas é mais do mesmo; na verdade, a capacidade de me surpreenderem é cada vez mais pequena, mas acabam sempre por me causar alguma frustração, alguma irritação; é como se tivesse uma velha borra emocional acomodada minha cabeça.
"A sério, camaradas?", penso. 
Às vezes, retalio, começo a cantar para mim e para eles:
"Gimme me all you got buddy, gimme your best shot, c'mon baby"
(em inglês, quase tudo soa mais "cool")

Eles, os pensamentos, entram no hall da minha mente sem pedir autorização, nem sequer limpam os sapatos no tapete de entrada, "é tudo nosso". Sacanas bastardos! No entanto, considero-me um mestre nesta arte e um mestre sabe render-se por breves instantes. 
Talvez a vitória esteja logo a virar da esquina. Talvez até não esteja. Mas eu vou estar sempre aqui para observar.

quarta-feira, outubro 15, 2025

Ego

 












Somos confrontados diariamente com a nossa carapaça mental, ou se quiserem, com o nosso Ego.

O Ego é uma estrutura psíquica que ser reguladora e ilusória ao mesmo tempo.

Pede-nos, na maioria das vezes, para interpretar um papel que parece ser fruto de uma programação obsoleta que está muito enraizada na Humanidade.

Quando estamos em processo de transformação, ora põe-nos na defensiva ou em ataque, somos acometidos por ataques de raiva ou de pânico; pode ser muito doloroso e confuso.

Planta-nos sementes, monta "ganchos" mentais que podem causar um ciclo de sofrimento, de angústia.

A história é repetida vezes sem conta, às vezes durante anos a fio.

Temos então de assinar um pacto de não-resistência. O trabalho aqui é ficarmos atentos a esta enorme e intrincada peça teatral montada pelo nosso Ego.

Se é fácil?
Não, não é.

Mas a partir do momento que começamos a observar a simulação egóica, esta começa a ser desmontada e nasce uma espécie de clarão de Fé - e atrevo-me dizer - e um clarão de Amor dentro de nós.

(Este texto não pretende ser um texto de ficção)

domingo, outubro 12, 2025

Missão: Terra

Uma Voz que me diz 

Que viemos a este mundo 

Para sentir e tocar 

Para sentir as 1001 emoções 

Para tocar e ser tocado 

Pois tudo passa pela pele


Alegria, tristeza, amor,

medo, raiva.

Uns sentem mais do que outros 

Antes de escolher a Terra

Perguntaram-me

"Tens mesmo a certeza?

Não vai ser fácil. "

E aqui estou neste turbilhão 

Nesta paz, nesta paixão,

Nesta melancolia,

Nestes humores,

Nesta Vida 

Que nos ensina tanto

Que pode magoar sim

Mas que

Tanto nos dá também.






sexta-feira, outubro 10, 2025

Noir

Ao que parece tenho dois Napoleões na família e não sabia.

Um é silencioso, astuto, estratega, acha-se muito perspicaz, ardiloso. Não falo com ele há anos, nem tampouco me apetece.

O outro tem o mesmo tamanho do Napoleão original, o corso. Tinha-o em boa conta até há bem pouco tempo, mas dados os últimos acontecimentos, revelou-se ser pior do que o primeiro: mostrou-se um verdadeiro "sacaninha" manipulador. 

Os dois irmãos Napoleões não falaram entre si durante anos a fio. A mulher que os pôs ao mundo ficou doente e foi preciso chamá-los à razão para reatarem, para começarem a falar um com o outro, para começarem a serem parte activa nos cuidados da progenitora.

Mal nós sabíamos que esta união inesperada iria causar mossa, tristeza, frustração, indignação, revolta.

E porquê? Dinheiro. Sempre o dinheiro

Mais uma vez os pormenores não interessam.

No fundo, os três, a mãe e os dois filhos, vieram a este mundo para tentar consertar a respectiva relação, para encontrar harmonia entre os três. O que eu não contava era que este "duo dinâmico" fosse a causar tantos estilhaços para este lado da família que sempre cuidou essa mulher de forma amorosa e desinteressada.

Confusos? Eu também.

Parece que às vezes estou a viver um daqueles filmes noir dos anos 50, com actores sofríveis de 2ª linha, cheio de tramas complexos e "anti-heróis". 

O que eu queria mesmo era uma bela "femme fatale" que varresse estes dois Napoleões fajutos para fora de cena outra vez.  

segunda-feira, outubro 06, 2025

Esfoliante de alma

Hoje, talvez por estar Lua Cheia - os astros são sempre excelentes bodes expiatórios para a nossa condição humana - as minhas emoções e o meus medos estão ao rubro! A minha mente está hiper-electrificada e os pensamentos vão e vêm de diversas formas.

É como se alguém lá em "cima" ou talvez "cá dentro" rodasse o botão de volume do EGO para o máximo, para o vermelho, e dissesse: "é agora ou nunca. Vamos lá lidar de vez com esses velhos medos, com estas inseguranças que sabem a mofo, com essas fragilidades". 

Poderá ser a criança interior, sim, mas sinto que é um Chamado mais forte, mais radical, para quebrar camadas que já não me servem.

Quero pensar e sobretudo sentir que é algo tão purgador, tão potente, que poderá interromper o ciclo das falsas crenças, do enorme jogo de espelhos à volta da minha mente.

É como me tivessem a esfoliar a alma para depois me besuntarem com o bálsamo mais suave do universo.

Seria tão bom se assim fosse, não?

Vamos todos pensar que sim. 

domingo, outubro 05, 2025

Corto









Numa destas noites pré lua cheia, sonhei que tinha entrado numa das histórias de Corto Maltese.

Tudo parecia irreal dentro do próprio real onírico. 

Ela estava à minha espera com um daqueles vestidos torneados, tacões altos, cabelo apanhado à concubina chinesa. 

Fumamos narguilé mas não havia ópio na sala. Vinho tinto, sim. Alguns gatos a acariciar as pernas debaixo da mesa. Também havia absinto - a fada verde - que foi ingerido pelos dois de uma forma muito pouco usual e que vou deixar à vossa imaginação. Usem-na.

Não havia nenhum mistério a resolver como nas histórias de Hugo Pratt. Esperem, vou corrigir esta última frase: o mistério foi lenta e intensamente consumado na divisão onde havia ainda luzinhas de natal a decorarem a janela. 

Quando acordei do sonho, a lua que testemunhou a cena já estava cheia e sorria trocista para mim. A doce melancolia trazida pelo luar envolveu-me e voltei a adormecer para sonhar que estava a sonhar.

sábado, outubro 04, 2025

Telhados de vidro


Uma combinação de genes e de vivências fizeram-me aquilo que sou. Não sou uma espécie rara per se, mas às vezes sinto-me como tal. No entanto, há milhões como eu por esse mundo fora. 

O meu subconsciente está separado do meu consciente racional por telhados de vidro. É isso mesmo, telhados de vidro. Acredito mesmo que possuo esta quase-exclusiva arquitectura mental. Tenho de fazer um encefalograma. O meu intelecto assiste do alto do seu camarote ao grande baile quase caótico que é o meu subconsciente. Parece uma enorme redoma transparente em que um está ciente do outro.

O nosso inconsciente (bom, pelo menos o meu) está repleto de personagens-sombra circenses que podem assumir a forma de:

- diabretes que me dizem para fazer actos inusitados como atirar uma bela garrafa Evian ao meu cliente que mudou de ideias e que quer moelas em vez de tremoços, ou - então, a minha favorita - diz-me " não tarda nada, meu caro, vais ficar louco como nós". 
"Está tudo bem", responde o intelecto.

- o meu evil twin que me diz que não sou tão gracioso e tolerante como penso que sou; 
"Está tudo bem", responde o intelecto.

- um grizzly enorme que caça salmões-emoções a torto e a direito neste meu rio interior conturbado e que quando cutucado esta fera pode ser assustadora (não tanto como gostaria); 
"Está tudo bem", responde o intelecto.

- um sussurrador traiçoeiro e oportunista que me provoca com inesperadas e enganadoras palavras-forma que me entorpecem o raciocínio e que, às vezes, me provocam medo e apreensão; 
"Está tudo bem", responde o intelecto.

- um sátiro dionisíaco que quer cobrir de forma embriagada todas as belas mulheres deste planeta;
"Está tud....espera, vamos reavaliar este tipo comme il faut", sugere o intelecto.

Sidarta Gautama - que era humano como eu e o caro leitor - atingiu o nirvana com a prática contínua de meditação, ou seja, Sidarta "extinguiu o fogo" que era sinónimo de sofrimento, de ilusão, de desejo.  Aceitou a tristeza como tristeza e aceitou a alegra como alegria, e por aí fora. Deixou de ter telhados de vidro dentro da sua cabeça, consciente e inconsciente tornaram-se num só, ficou Iluminado, e por isso, chamaram-lhe de "Buda". 

Também acho que tenho mini-Budinhas por cima ou por debaixo do meu telhado de vidro que é muito revelador, com traços muitos "jungianos". É claro que estes seres circenses que habitam no meu inconsciente causam-me ansiedade e stress, mas é o preço a pagar pela Liberdade, pelo Livre-arbítrio obtido por Adão e Eva. 

No fundo, eles estão numa missão, são agentes de mudança, de alerta, para me conciliar com o passado e para, a partir daí, descobrir e sentir Amor incondicional (e acreditar que são muito mais do que duas belas palavras).