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| Imagem de Rui Ricardo | 
EM frente ao espelho da casa de banho, arregalo os dentes e com o 
indicador puxo as pálpebras para baixo. Fiapos vermelhos irrigam-me as 
escleras. Não há indícios de tromboses até agora. Pego na escova de 
dentes e movo-a para a esquerda e para a direita, e depois para cima e 
para baixo enquanto tento segui-la com os olhos. Toco na ponta do nariz 
com os indicadores e depois coloco a mão sobre o coração. Nada de 
sopros, nem palpitações nem taquicardias. Por enquanto. O dia ainda é 
uma criança. Antes de me levantar, senti apenas um pequeno polvo a 
apertar-me um pouquinho a mitral, nada de muito preocupante. Talvez seja
 ansiedade – prendo bem o M.A.P.A. à cintura, de vinte em vinte minutos,
 a espécie de walkman apita para me medir as tensões. A braçadeira 
insufla-se automaticamente esganando-me o bíceps esquerdo. Tudo isto 
para prevenir o conhecido “síndrome de bata branca”. Não posso tomar 
banho durante as 24h que iria usar o aparelhómetro. Ainda bem que está 
frio. Visto um pulôver à marinheiro para encobri o M.A.P.A. à cintura e 
um kispo vermelho (na verdade é um Umbro) que me faz lembrar 
sempre o Bobby Robson. “Mas é vermelho, o Bobby Robson era…”. Pois é. 
Não perguntem, não sei explicar. Três sacos de lixo pretos acumulam-se 
na marquise. Tenho de os despejar sem falta logo à noite. Vivo num 
apartamento no 7º andar de um prédio com quase trinta anos. Saio todos 
os duas por volta das 7:50 para ir trabalhar. Sou assistente 
administrativo num hospital e raros são os dias em que suporto o meu 
trabalho. 
(...)Texto na íntegra também aqui.
