Vivo sozinho e ainda sinto falta da minha mulher. Faz hoje um ano que ela morreu. Hoje vou dormir melhor, estou exausto. Consegui trazer para casa o banco de jardim onde costumávamos namorar. O filho do meu vizinho de baixo ajudou-me a trazê-lo ontem de madrugada. Apesar de todo aquele metal na cara e de cheirar mal, não é mau rapaz. Ele e o pai estão sempre aos berros um com o outro.
Foi neste banco que pedi a minha mulher em casamento. Os meus dois filhos visitam-me de longe a longe, porque não têm paciência para os meus queixumes de velho. Que surpresa, não? Sabemos que estamos velhos quando todos os meses parecem Novembro e quando não controlamos o nosso esfíncter em locais públicos.
Eu cresci para a minha mulher e a minha mulher cresceu para mim. E isso é amor, seus bastardozinhos. Pus o banco no meio da sala de estar, ao lado da cadeira de cabeleireiro onde ela passou quase um quarto da sua vida. Ela era muita vaidosa e ciumenta. É provável que se tenha queixado de mim nesta cadeira. Gostava muito dela. Dois meses depois da sua morte, comprei a cadeira ao salão que ela frequentou durante vinte e um anos. Veio com um daqueles vaporizadores de cabelo que apareceram nos anos sessenta e, apesar de eu ter a cabeça grande, consigo metê-la lá dentro enquanto vejo televisão à noite. Há noites em que adormeço sentado na cadeira e acordo de madrugada com o vidro embaciado. Às vezes, acordo com uma erecção (é verdade, seus bastardozinhos, não tenho porque mentir) e fico acordado a pensar nela até o sol nascer.