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Pierre Bonnard
É uma criança dividida ainda pela noite e pelo dia. Esta separação é uma chaga interna que lhe percorre o corpo, de alto a baixo, e que sangra. De um olho negro, corre-lhe um fio de sangue como um cordão umbilical que a liga à noite. No outro há o espanto irreflectido de uma possibilidade inacreditável: uma pálpebra isenta, suspensa sobre um olho que se abre à luz demasiado possível, demasiado real, demasiado bela. É este todo o seu horror.
António Ramos Rosa, Círculo Aberto
Editorial Caminho, 1979