terça-feira, abril 03, 2018

Descida

Desci a rua Mousinho da Silveira que não estava calcetada, ainda era em terra batida. Havia néons e leds nas fachadas e nas montras das lojas. Uma contradição tecnológica que era aceitável na minha cabeça. O meu cabelo estava do tamanho do cabelo do Carpinteiro, entrei na primeiro salão que encontrei. A dona tinha um bronze de solário, a boca era ampla e dardejava um olhar de matrona romana. Lavou-me o cabelo mas não
quis cortá-lo. Levou-me para a pequena sala de depilação nas traseiras e tirou-me as calças. Depois tirou as suas de lycra rosa. Um fio branco, arqueado, contínuo contornava-lhe a cintura. A barriga não era escandalosa, aliás despertou-me ainda mais a libido. Fez-me aquilo que tinha de fazer, senti-me bloqueado no início com o Alain Delon desbotado na parede a olhar para nós, mas depois conseguir dar andamento à coisa. A boca da senhora era um aspirador industrial e olhava constantemente para mim, de baixo para cima, como nos filmes HC. Fin.
- E o cabelo?
- Não to corto, é um crime cortar essa cabeleira à Sansão.
Despediu-se com um beijo molhado no rosto e mordeu-me a orelha.
Meti pela rua São João onde estavam velhotas em todas as portas. Eram todas amarelas como as fachadas dos prédios a caírem de podre. Umas estavam com as mãos a segurarem os grandes queixos, outras observavam simplesmente quem passava.
Não entrei no túnel da Ribeira. Algo ou alguém não me deixou entrar. não sei dizer-vos o que era. A rua dos Mercadores não existia. Descobri um caminho de lama que seguia em paralelo com a parede em abóbada do túnel. Um regato feito pela chuva dividia o caminho. Uma enorme poça mais à frente. Os grossos salpicos do salto cagaram-me as calças. A Ponte. O Douro era igual ao Douro que todos nós conhecemos.