domingo, novembro 23, 2025

Duelo

Dois homens de barba rija resolveram defrontarem-se em duelo. A honra do mais velho foi manchada pelo mais novo e só um duelo poderia resolver a questão. Não vale a pena dizer aqui o que provocou tal indignação. Não há tempo nem espaço para isso. E nem paciência, atrevo-me a dizer. 

A arma fora escolhida consensualmente. Facas. O mais novo tinha fobia a armas de fogo, recusava-se sequer tocar numa. O mais velho não se opôs; a verdade é que já via mal do olho esquerdo e a mão direita já não era o que era, tremia-lhe. Além disso, cresceram ambos na rua, sob a lei das ruas, sabiam tudo o que havia para saber em matéria de lutas com facas, punhais, adagas, navalhas, etc. 

E porque não espadas, poderá perguntar o leitor? Associamos quase sempre estes duelos de honra a espadas ou revólveres. 

Porque assim me apetece; sou eu o autor desta história. Relaxe, caro leitor. 

Os padrinhos providenciaram as melhores facas disponíveis no mercado. O local do duelo foi num jardim pouco frequentado nos arrabaldes da cidade. 

Chegara o dia. O mais velho, a parte ofendida, chegou mais cedo. Estava impaciente e queria limpar a sua honra, resolver a questão o mais rapidamente possível. 

O jardim estava deserto aquela hora. Apenas se ouviam as folhas a serem varridas ao de leve pelo vento. Esperou, esperou, voltou a esperar. Nada, ninguém. O padrinho já se tinha ido embora. Resolveu ficar, nada o demovia. A sua honra era agora a coisa mais valiosa que possuía. Antes era a sua mulher mas ela já não pertencia ao mundo dos vivos. Foi tudo muito rápido, um terrível aneurisma. Já tinha passado um ano.

Escureceu rapidamente.

De repente, caiu em si. Sentiu uma angústia enorme a crescer-lhe no peito. Deixou-se sentar no banco mais perto e começou a chorar convulsivamente. 

Outra vez. 

A sua cabeça voltou a pregar-lhe partidas. Não havia motivo real para estar ali. Foi tudo uma enorme ilusão, um encenação da sua mente. Não havia nem ofensor nem ofendido. Olhou para a faca que tinha mão. Apertou o cabo com força e sentiu uma raiva enorme. Mais lágrimas que caíam gordas sobre a terra. Lembrou-se de Linda que partiu há mais ou menos um ano. Ouviu aquilo que parecia ser o piar de uma coruja. Lançou a faca para trás dos arbustos, deu um enorme suspiro e arrastou-se até casa.